terça-feira, 6 de maio de 2008

TERPSICHORE IN SNEAKERS – um ponto para reflexões


Por Thaís Catharin


Recapitulando a história da dança moderna e pós-moderna, o texto de Banes apresenta a trajetória da dança nestas duas vertentes tão importantes para a atualidade. Desde a revolução e da quebra de valores tradicionais com Löie Fuller e Isadora Duncan, passando pela ruptura do lirismo de Merce Cunningham até a atualidade, a dança transitou em tão pouco tempo por várias transformações e mudanças de valores, ganhando assim estilos variados e autonomia em suas performances.
Segundo Banes, no século XIX a América não sustentou a tradição do Ballet Clássico, fazendo com que os artistas da dança buscassem novas formas de expressão no movimento. A Evolução das propostas e da maneira de trabalhar o corpo foi acontecendo a partir de novas tentativas, ganhando adeptos e criando “clãs”, para experimentações. A fase da Judson Church foi talvez a mais agitada e forte, pois tinha vários “seguidores” e artistas de muitas linguagens, o que contribuiu para a dança na busca de novas possibilidades e enriquecer o trabalho dos coreógrafos.
Como Sally Banes coloca, mesmo com valores e idéias diferentes, cada fase da dança moderna e pós-moderna buscava uma proximidade com os movimentos naturais (BANES, 1979). Hoje não é diferente. Coreógrafos e artistas da dança buscam uma proximidade da arte com a vida, com o homem, seja no movimento, seja nos temas das coreografias, frisando aqui um conceito de natural como tudo aquilo que permeia a vida humana na sociedade contemporânea. Cunningham também contribuiu muito para a apresentação de novas possibilidades de movimentos, trazendo uma outra proposta para a dança: o movimento pelo movimento. Esta idéia contaminou o pensamento de muitos coreógrafos e pesquisadores de movimento contemporâneos.
Penso que a dança hoje busca as possibilidades de passar uma idéia, algo em comum a discursos e reflexões que envolva “corpo”. Para isso não é necessário apenas pensar em temas que revolucionem, mas também ter uma preocupação em colocar idéias já discutidas porém em uma organização diferente, que possa gerar outras vias de pensamentos.
Entendo que as rupturas proposta pela dança moderna com os padrões estabelecidos na dança por séculos, trouxeram à dança pós-moderna inovações, abriu portas para novas linguagens, articulações e conceitos dentro da dança, como o emprego da tecnologia e temas político-sociais, relevantes e muitas vezes contribuintes fortes para a humanidade em qualquer período, no qual acredito ser o papel da arte Em seu livro Dançar a Vida, Roger Garaudy afirma: “A dança moderna é a que exprime o homem moderno com suas angustias, seus combates e suas esperanças” (GARAUDY, 1980. p. 175). O mesmo é o pensamento contemporâneo nas artes que atualmente buscam uma forma de representação dos estados humanos. Como um exemplo, creio que a tecnologia é uma dos apoios para tal. Se na crise da dança pós-moderna ela aparece apenas como forma de experimentação, hoje ela é a marca de muitos criadores, independente se é o meio mais eficaz para chegar a um resultado, uma forma de arquivo ou até mesmo o tema de trabalhos.
O texto de Sally aponta que a geração Judson atribuiu a inclusão de diferentes linguagens dentro de seus trabalhos, isto incluía pessoas sem experiência com dança. Assim, qualquer um poderia coreografar. Murray Louis relata este período como “tristes dias” quando, segundo ele, a composição foi substituída pela permissividade onde muitos criavam sem saber o que estavam fazendo realmente, apenas pelo simples discurso de que qualquer movimento poderia ser dançado (LOUIS, 1992. P 136).
Penso que se linguagens diferentes da dança forem bem empregadas tornam o trabalho rico e interessante, porém discordo que qualquer artista que não seja da dança e/ou sem o mínimo de experiência corporal e metodológica possa coreografar, caso contrário a colocação de Louis sobre a permissividade sem limites na dança é bem fundamentada. Será que a dança é mesmo um espaço de ninguém? Qualquer pessoa pode sim dançar, mas dentro de um propósito artístico e de criação penso que é necessário uma dedicação e principalmente respeito com a linguagem da dança. Para se tocar um instrumento ou esculpir uma peça de argila é necessário conhecimento e prática, mesmo que seja para “desconstruir” o tradicional e construir algo abstrato. O mesmo acontece com a dança. Para uma compor uma obra de dança é necessário mais que uma sensibilidade artística e uma intuição de como atingir o público, visto que o corpo no espaço da dança tem muita responsabilidade sobre o discurso apresentado, logo precisa estar preparado para isto e consciente do que faz.
Minha visão pode ser um pouco arcaica e egoísta diante dos conceitos de dança hoje, porém questiono onde fica o afinamento, a pesquisa corporal do bailarino e do coreógrafo, os anos de aulas e estudos e principalmente a singularidade do trabalho com dança. Não digo que outros artistas não possam “migrar” para a dança, pelo contrário, acho enriquecedor para ambos e não acredito numa fronteira entre as artes, mas que os artistas saibam sobre e respeitem este lugar, procurando uma forma de estudo dentro da dança para alcançarem seus objetivos.
Diante de todos os caminhos que a dança moderna abriu para os artistas contemporâneos, mostrados no texto de Sally, me pergunto qual o lugar que a dança ocupa hoje. Por se tratar de uma preocupação da dança como produção de conhecimento, representação social, discussão sobre o corpo contemporâneo e etc., e de que estes atinjam e modifiquem a sociedade, é contraditório que poucas pessoas conheçam ou participem destes espetáculos e processos coreográficos. Garaudy alega que este problema está ligado à nossa cultura, ao nosso estilo de vida vinculado a cultura em massa (GARAUDY, 1980. P. 177). Tenho que concordar com o autor em alguns aspectos, pois os espetáculos mais prestigiados pela grande massa ainda são os de danças tradicionais ou os apresentados pela mídia, que também tem suas questões mas no entanto discuto o lugar da dança contemporânea. Não sei quando a ampliação do público para dança contemporânea acontecerá. Prefiro acreditar que caminhamos para isso, mas muito lentamente, quando, na minha opinião, algumas coisa são imprescindíveis de serem levantadas agora para um público maior. Ao mesmo tempo me pergunto se o público é e como é preparado para isso, mas esta é uma outra vertente de discussão que opto por não me aprofundar neste momento. Deixo apenas uma dúvida pessoal que vem sendo repensada constantemente.


Referências Bibliográficas

- BANES, S. Terpsichore in sneakers, Post-Modern Dance. Boston: Houghton Mifflin, 1979.
- GARAUDY, R. Dançar a Vida. Rio de Janeiro: Nova fronteira, 1980.
- LOUIS, M. Dentro da Dança. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992.

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