sexta-feira, 4 de julho de 2008

O Corpo-Sonoro e a Dança

Gabriel Bueno


Para entendermos o corpo como fonte sonora, precisamos refletir sobre o que é som e que corpo é este em movimento.
Som é movimento, e sem movimento não pode haver som, e todo movimento produz som. É sabido que som é onda, que corpos vibram, e que essa vibração se permite sob a forma de uma propagação ondulatória consideramos aqui que todo tipo de corpo vibra, mas vamos nos ater somente ao corpo humano.

“O som é, assim, o movimento em sua complementaridade, inscrita na sua forma oscilatória. Essa forma permite as muitas culturas pensá-lo como modelo de uma essência universal que seria regida pelo movimento permanente”. (J.Wisnik 1999) 1

O corpo produz diversos sons e muitos não são percebidos pelo mecanismo auditivo, o mais evidente são os produzidos pela voz, todo movimento das cordas vocais reverbera no corpo e para fora dele, ou seja, a reverberação é entendida como reflexo de calor emitido pelo corpo, energia que se expande.
Voz é som e a emissão de ar que passa pela laringe geram inúmeras possibilidades de vocalizar o ar; as inúmeras tensões musculares dão o tônus da vibração do movimento da passagem de ar pelas cordas vocais. A voz é intrínseca ao corpo humano, e, portanto, entende-se a importância do estudo de movimentos de dança que a explorem em suas distintas sonoridades como recurso para a criação coreográfica em dança.
No estudo do canto o corpo esta ligado a voz, mas no estudo da dança a voz não é muito estudada principalmente em pesquisas coreográficas, e discuto aqui a importância de a considerarmos; existindo um vasto campo de possibilidades para ser explorado, a sonoridade da voz pode se corporalizar ao movimento do corpo. A voz é o corpo onde um transforma o outro, o movimento do corpo modifica a voz e a sonoridade da voz o corpo, a respiração é a responsável por fazer o som sair, significar junto com o movimento. Assumir o som que aparece para transformar o
1. José M. Wisnik. O som e o sentido, p.15, 1999.

significado do gesto é transitar entre a consciência do movimento com o não controle vocal para que surjam propriedades que não é canto e nem dança, mas a
mistura destes fazeres levando ao dialogo de entender voz como movimento do corpo e corpo como movimento da voz.
Fernando Aleixo aborda em seu livro A Corporeidade da Voz o termo “corporeidade”. Ele nos fala que esta corporeidade é envolvida por três aspectos, a dimensão sensível, dinâmica e poética. A dimensão sensível é o impulso que gera a voz e o movimento, a matéria física, os sistemas, o corpo. A dimensão dinâmica é presença do movimento e do som vocal no espaço, é ação, parâmetros como volume, intensidade, timbre e altura. A dimensão poética é a relação da voz corpo com os outros, é o corpo em contato com os significados gerados pela dimensão sensível e dinâmica que a tornam poética.
É fundamental a prática destas relações no fazer artístico do ator e cantor, o desenvolvimento destas habilidades estão implícitas no corpo e a dança pode envolver estes fazeres para que bailarinos conscientizem a voz também como movimento, não se tratando de que necessitamos dominar o canto mas se utilizar dele para a transformação da dança no corpo.

“A prática de uma experiência sensível capaz de promover o desenvolvimento do saber do corpo é essencial no trabalho do ator. A formação que envolve a sensibilidade corpórea possibilita o comprometimento pleno do ator da criação, pois redimensiona suas capacidades de agir vocalmente de modo sinestésico e poético”. (F. Aleixo 2007) 2

Em um trabalho colaborativo com a bailarina Aline Valim desenvolvemos alguns procedimentos que trazem estas relações abordadas ate então, o uso de diferentes bases de apoio do peso do corpo enquanto cantamos nos possibilita compreender os lugares de apoio do som vocal, dançar cantando ou cantar dançando como exercício, nos faz reconhecer domínios de movimento que entendemos que são coisas distintas, conforme o cansaço físico aumenta percebemos que surge formas e sons que fogem do controle normal, ou melhor do habitual padrão. A respiração sugere outros formatos vocais e de movimento no qual o som se apóia, a fadiga, os órgãos, a reverberação, a palavra, são fatores que qualificam o dialogo desta mistura de dança e canto.

2. Fernando Aleixo. A corporeidade da voz, pg 47. 2007.

A dança e o canto permeiam nossa investigação e nos coloca questões de não haver a necessidade de categorizar mas de compreender dois domínios distintos que se relacionam para uma sugestão do desenvolvimento de uma suposta linguagem, o transito dos lugares encontrado por nos, nos faz acreditar de que o movimento é ponte de legação e a emanação de gestos e sons são possibilidades de arte que se corporifica em comunicação.

Referencias:
WISNIK, J. M. O som e o sentido: uma outra historia das musicas. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
ALEIXO, F. M. Corporeidade da voz: Voz do ator. Campinas: Editora Komedi, 2007
MENEZES, F. A acústica em palavras e sons. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2003.

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