sexta-feira, 25 de abril de 2008

DANÇA TEMPORARIAMENTE CONTEMPORÂNEA

Por Angélica Gallardo

Nos anos 80 uma atenção súbita foi dada ao corpo: os tiques, as posturas, o movimento de cada corpo e a somatização física começaram a destacar-se e a provocar investigação. A partir daí, passou a ser falado de uma inteligência muscular que nos faz reconhecer o corpo, suas funções e a comunicação que por ele pode ser feita. Assim nasciam as Artes do Corpo – dança, canto, performance física e teatro-fisico.
O avanço da tecnologia fez surgir corpos Hi-Fi, que seriam corpos de alta fidelidade na execução dos movimentos, e levou à Arte do Corpo uma idéia de sublime em relação às outras artes, conquistando assim, um lugar nobre perto das tradicionais e reconhecidas Artes. Na minha opinião, quando se fala de novas tecnologias somos, tendencialmente, levados a pensar que se trata de um universo à parte, algo que entra cada vez mais nas nossas vidas e ao qual, em menor ou maior grau, nos indica que algo está a mudar. A fotografia, por exemplo, nos permite vislumbrar rostos, emoções técnicas e certos aspectos dos espetáculos realizados. Posteriormente, a televisão trouxe uma maior harmonia aos espectadores da dança, sendo possível estar num ponto do planeta totalmente oposto daquele onde se realiza um evento sem, no entanto, perder os seus contornos e, muitas vezes, ganhando até nitidez e uma maior visão de conjunto do que ao vivo. Permitiu, e permite ainda hoje, que milhões de pessoas que não podem estar em espaços teatrais, por diversas razões, possam tomar conhecimento do que se está fazendo num determinado local.
O uso do filme e do vídeo, iniciado em meados de 1960 nas criações do coreógrafo norte-americano Merce Cunningham, marcam o início de uma nova autonomia na Dança. O vídeo-dança difere dos filmes de dança por não ser um registro de uma obra coreográfica previamente existente, que deve ser readaptada para a tela para se tornar um vídeo-dança e, difere dos videoclipes por priorizar o movimento e a intenção do filme, sem que este esteja necessariamente associado a uma música específica, é um diálogo entre a dança e o vídeo no qual estas linguagens se tornam indissociáveis como uma obra coreográfica que existe apenas no vídeo e para o vídeo.
Juntamente ao Corpo Hi-Fi há também o corpo-livro que é uma comunicação organizada das Artes do Corpo e que ultrapassa o seu vetor atlético impondo-se com algo da ordem comunicacional, existencial, político, social e histórico. O corpo-livro se edifica e se dá em espetáculo a partir do corpo de cada intérprete, da sua biografia, dos seus sentimentos. Um exemplo deste corpo é o modo como Pina Bausch desenvolve seus trabalhos, pois as experiências de vida dos bailarinos servem de base para suas coreografias e várias delas são relacionadas à cidades de todo o mundo, pois são de suas turnês que ela tira idéias necessárias para seu trabalho. Ao meu ver, Pina Bausch preocupa-se mais com o corpo e com que ele que fala, sente e expressa, do que com questões tecnológicas. Através da repetição de gestos, palavras e experiências do cotidiano a dança teatro, nas obras de Bausch, pode ser definida como a consciência do corpo quanto a sua própria história como tópico simbólico e social em constante transformação.
Ao longo dos anos a dança e o corpo evoluíram e continuam evoluindo em conjunto, e ambos em sintonia com a tecnologia, e, graças a esses avanços, o corpo passou a ter o mesmo peso que as idéias. Existirá sempre uma mutação permanente no mundo, que se expande e se contrai conforme os fatos aparecem e interferem, configurando tudo de outro modo, em outra época, à medida que o tempo passa.

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